Conforme o inverno se aproxima em meio à pandemia, muitos de nós procuram maneiras de nos mantermos seguros e saudáveis. O segredo pode estar em um antigo provérbio irlandês: "Um bom riso e um longo sono são os melhores tratamentos recomendados pela medicina." Rir de fato pode ser o melhor remédio, já que mantém nosso humor positivo e nos ajuda a dormir melhor. Quando dormimos melhor, nosso sistema imunológico produz e libera proteínas (citocinas) que ajudam nossos corpos a combater vírus e inflamações. Isso faz de um sono saudável uma grande ferramenta para ajudar a encarar o furacão coronavírus.
Pensando dessa maneira, podemos nos perguntar o quanto a COVID-19 impactou nosso sono (para melhor ou pior). Centenas de estudos conduzidos desde o início da pandemia abordam a questão. Até o momento, há vários tipos de respostas.
Alguns decidiram aproveitar esse momento como uma oportunidade de desligar seus alarmes e recuperar o sono perdido. Um estudo recente com 25.217 participantes saudáveis dos EUA e 18 países europeus descobriu que as pessoas têm dormido mais tempo do que o normal durante a pandemia. Resultados similares apareceram em outro estudo, em que as informações de 14.000 participantes saudáveis de 11 países indicaram que eles haviam deixado o despertador de lado e dormiam de oito a 11 horas por noite. Outros estudos compararam o sono das pessoas com e sem insônia antes da pandemia e descobriram que um quarto daquelas que tinham insônia pré-existente sentiram melhoria significativa na qualidade do sono durante os períodos de confinamento.
No entanto, nem todo mundo dormiu bem nos últimos tempos. Na verdade, muitos desenvolveram dificuldades para dormir, algo que não tinham antes da pandemia. Um grupo amplamente impactado de forma negativa são os trabalhadores de saúde da linha de frente (médicos, enfermeiras e paramédicos). Muitos destes trabalhadores, que não tinham distúrbios de sono antes da pandemia, agora relatam insônia aguda. Familiares dos trabalhadores da linha de frente também começaram a ter mais dificuldade em dormir, pois acabam se preocupando com a saúde e segurança de seus entes queridos.
Por que a pandemia gerou tantos efeitos diferentes?
Para reduzir a transmissão da COVID-19, pede-se às pessoas que se resguardem em casa e evitem interações sociais. Alguns escritórios adotaram programações mais flexíveis, permitindo que os funcionários tenham mais controle do momento em que começam e terminam o expediente. Essas mudanças podem ter impactado o sono das pessoas de diversas maneiras:
Horário de trabalho que coincide com o relógio biológico de sono. Muitas pessoas só começam a sentir sono à noite e precisam dormir mais pela manhã para descansarem o suficiente. Com os horários de trabalho flexíveis que foram incorporados no ano passado, os trabalhadores puderam seguir seus relógios biológicos e dormir o quanto precisavam. Isso com certeza explica por que algumas pessoas têm conseguido dormir por mais tempo e melhor.
Sem necessidade de olhar no relógio. Para quem sofre de insônia, saber que não há um horário rígido para acordar e que elas podem dormir mais tempo pela manhã pode ter ajudado a reduzir o estresse ao acordar no meio da noite ou as dificuldades em pegar no sono, quebrando o ciclo vicioso do sono/estresse. Isso pode explicar por que algumas pessoas que tinham insônia antes da pandemia passaram a sentir melhorias no sono durante o confinamento.
Em casa sem mais ninguém. Para quem sofre de ansiedade, tristeza, solidão e/ou tendência a se preocupar com saúde, ser forçado a ficar sozinho por muito tempo enquanto exposto à "infodemia" (a enxurrada de informações sobre o coronavírus oriundas de várias fontes, confiáveis ou não) pode ter gerado mais dificuldade em pegar no sono e/ou se manter dormindo.
Relógio biológico confuso. A luz é a maneira de o cérebro de dizer que horas são. O cérebro interpreta a luz brilhante como "manhã" e a escuridão ou luz fraca como "noite". Nos últimos tempos, muitas pessoas passaram mais tempo dentro de casa, sem poder receber luz solar suficiente durante o dia e com muita luz artificial durante a noite. Isso pode perturbar o funcionamento do relógio biológico, resultando em uma noite mal dormida.
Trabalhar demais. Os trabalhadores da saúde que desenvolveram insônia aguda tinham rotinas pesadas, chegando a trabalhar mais de 40 horas por semana sem poderem tirar folgas de pelo menos 30 minutos.
Vendo os desafios mencionados, como podemos manter um sono saudável durante a pandemia? Aqui estão algumas sugestões:
Crie e siga uma programação. Tente criar uma rotina alinhada às preferências naturais do seu corpo e siga-a com consistência. Você pode combinar sua programação a uma rotina para a hora de dormir que ajudará você a pegar o sono e que pode ser usada no mesmo horário todas as noites.
Ajude seu relógio biológico a saber a hora certa. Observe se você está recebendo o tipo de luz certa no horário certo do dia. Tente ficar fora de casa de 30 a 60 minutos pegando sol. Se não houver muita luz — como no inverno do hemisfério norte — você pode usar uma lâmpada brilhante pela manhã. À noite, faça o melhor possível para limitar sua exposição à luz forte
Acalme-se perto da hora de dormir. Use técnicas de relaxamento para desacelerar sua mente antes do sono. Isso permitirá que você se preocupe menos e adormeça mais tranquilamente.
Priorize escolhas de vida mais saudáveis. Comer de maneira saudável e praticar atividades físicas diariamente ajuda a melhorar seu sono.
Monitore sua saúde mental e peça ajuda. É importante monitorar sua saúde emocional e pedir ajuda quando você nota uma mudança.
Lembre-se de que a pandemia vai acabar! Investir em um sono melhor agora ajudará você a passar tranquilamente para o novo normal pós-pandemia, seja como ele for.
"Nunca perca o tempo que você pode passar dormindo." — Frank H. Knight
Biografia do autor
Reut Gruber é cientista, psicóloga e especialista do sono. Ela é professora adjunta do departamento de psiquiatria da McGill University e diretora do laboratório Attention, Behaviour and Sleep (atenção, comportamento e sono) do Douglas Mental Health University Institute; diplomada na American Academy of Cognitive Therapy (ACT) dos EUA; psicóloga licenciada, l’Ordre des Psychologues du Québec (OPQ), QC, Canadá